Introdução do conto; contém revelações de inrredo (spoilers):
Poucas histórias para crianças celebram o sofrimento com o tipo de paixão deste conto sobre uma vendedora de fósforos. A criança frágil e desamparada que morre de frio na véspera do anonovo tornou-se uma espécie de ícone cultural, a vítima de um pai brutal (muito mais cruel que os ogros e bichos-papões dos contos de fadas) e de uma sociedade desalmada. Até a natureza lhe volta as costas, não lhe oferecendo abrigo nem sustento. A mágica dos contos de fadas desaparece, e a salvação chega apenas na forma da intervenção divina.
O narrador da história da vendedora de fósforos nos transporta
para o mundo mental da heroína, permitindo-nos sentir sua dor à
medida que a temperatura cai e o vento uiva. Também partilhamos
suas visões, primeiro de calor, depois de alimento, depois de beleza
e, finalmente, de afeição e compaixão humana. Se a imagem final da
história nos apresenta um cadáver congelado, a morte da pequena
vendedora de fósforos é ainda assim uma “bela morte”, envolta em
espiritualidade radiante e significado transcendente. Quer leiamos
seus sofrimentos como “torturas disfarçadas em pieguices” (como
o fez P.L. Travers, a autora de Mary Poppins) ou consideremos sua
infelicidade como a precondição para a passagem a uma esfera mais
elevada, a história impregna nossa imaginação e continua sendo
uma das mais memoráveis narrativas da infância.